quinta-feira, 16 de fevereiro de 2017

Dois canibais sem dentes

Eles se pegavam com fúria
Como dois canibais sem dentes
Nas sombras de uma pequena ruela
Escondida entre os prédios do centro
da cidade.

Na carteira de couro
Fez duas carreiras brancas de farinha
As narinas nem sentiram nada
Alguns segundos depois escorreram.

Se mesclaram na multidão alterada
Que cortava a madrugada com uma
tesoura cega
Viram um transsexual de batom vivo
Desejaram aquela boca.

sexta-feira, 10 de fevereiro de 2017

Os ditadores

Os ditadores quando estão bêbados
Mastigando canivetes
Não têm pudor
De dizer disparates
E criar passados gloriosos
Que nunca existiram
Para justificar
Um presente tortuoso
Nada glorioso
Cheio de sangue.

Os ditadores sempre
Asfaltam aquelas ruas
Somente aquelas ruas
Em que eles passam.

Os ditadores plagiaram Herodes
Quando se aproxima do Natal
Eles também matam as crianças
Que veem pelas ruas.

Os ditadores também sonham, às vezes
Que estão no jardim
Com as crianças e a esposa
Enquanto um atirador os mira
Do alto
De um prédio cercano.

sábado, 4 de fevereiro de 2017

De qualquer coisa

A fome como senhora do mundo
Empapuçada
A fome de qualquer coisa
Ela já não explica muito
Porque no final das contas
Todos, de alguma maneira
Sentem fome
Ela só poderia
Dar respostas
Quando apenas alguns a sentiam
Agora
Todos a sentem
A fome
De qualquer coisa.

Vinagre

Bebendo vinagre
Como se fosse vinho
Fumando o último cigarro
Do maço
Repetindo
Eloquências
Repetindo
Você
Que agora cheira cocaína
E bebe água
Num apartamento
Fechado
Cheio de dúvidas
Preste a explodir.

Não chore pelos viciados
Nem pelos filhos de assassinados
Que começaram desde cedo
A usar drogas.

Não chore pelas mães
Porque elas sempre sabem
O que dizer, o que fazer
O que não fazer.

Não chore pelos santos
Nem pelos filhos pródigos
Porque sempre há perdão
Para aqueles que voltam.

Não chore pelas flores
Que não resistem à luz do sol
Quando bem de manhãzinha
Elas aparecem desapercebidas.

segunda-feira, 16 de janeiro de 2017

Porque el día no puede ser suyo

Lo que separa el tiempo y el espacio
la concretude y el abstracto
en la dialéctica
de sus nalgas y senos
de los culos que me miran
y los ojos
mensurables
que me enseñaron
un casi amor
pero habia mentiras
entre sus piernas
menos que
en sus lábios.

ha llovido en las calles
de las ciudades miserables
adonde nadie duerme
en paz.

usted necesita despertar
para oír las palabras atrevidas
de los poetas muertos
por las dictaduras.

escuchame, porque tengo sed
de personas locas como nosotros
que bebieron veneno
en jugo de naranjas vivas.

ahora puede acostarse
porque el día no puede ser suyo
y nadie puede
cogerlo.

Em outras poesias

em outras poesias
eu já havia escrito
como você conseguia
com tanto amor
acalmar o tempo
que berrava enfurecido
naqueles dias violentos
onde a coisa mais grandiosa
que a gente cultivava
com certo receio e dor
foi destruída
por nossas próprias mãos
alguém, por favor
faça o tempo se calar.

em outras poesias
o pior de mim
o pior de ti
em versos medíocres
sem importância
mas há nenhum outro amor
nenhuma outra dor
que não sinta medo
de se aventurar.

em outras poesias
adulteradas
cheias de duplo
sentido.


sexta-feira, 16 de dezembro de 2016

Izabel Abreu

A vida nos impedia
Mas você foi a primeira
A notar as imperfeições
Na lua, na poesia
No mundo, na nostalgia
Bem aqui
Dentro da gente
No lugar mais cartesiano que existe
Mas você acabou
Quebrando as unhas
Ao arranhar as paredes
Enfurecidamente
Porque algumas partes de você
Veem a totalidade
Como um caos
Enquanto outras partes
Pensam que são deus
Para criar iguais e contrários
Mas você acabou
Se ferindo
Além e aquém
De tais suposições
Que se baseiam
Em livros não lidos
Dentro de caixas de papelão
Agora que o seu caminho
Se desmensura sob seus pés
Vá com a certeza
De que você é a única lúcida
Entre nós.

Já quebramos os pratos
Cagamos em sacolas plásticas e jogamos no telhado do vizinho
Fizemos a piadinha ridícula perfeita
Ao mijar, temos sentido um forte arrepio
Não temos praticado a prostituição
Porque as paredes sempre estão
Nos maldizendo
Não perca o seu tempo
Porque você é a única lúcida
Entre nós.

Ainda não demos o nosso showzinho particular
Mas já não importa tanto
Porque você sabe melhor que qualquer um
Como é doloroso saber que estamos
Voltando ao pó
A vida sempre lhe foi atraente
Porque ela é a sua própria
Contradição
É o que diferencia os coveiros dos cravos
Já que você é a única lúcida
Entre nós.

Carnaval

Os eróticos cheiravam cocaína
Sobre os cadáveres
Como se nada estivesse acontecendo
Enquanto isso
A avenida metia, gemia e gozava
Sons estridentes
Que nos assustou
Mas nada se comparou
Aos teus olhos azuis e vermelhos
Que refletiam as nuvens de sangue no céu.

O teu poeta

Eu sou o teu poeta
Não saberias me distinguir
Pois já tiveste muitos outros
Não há mais importância
Se não pensas mais em mim
Já não importa tanto como antes
Se essas palavras grosseiras
Rompiam
O silêncio da madrugada
Pois elas roncavam com descrença
No pé do teu ouvido
Do mesmo modo que eu esguichava
Desatinado
No pouco que havia
Nos confundido
Como as drogas diárias
Que tanto têm
Nos enlouquecido
Como os estupros
Que têm nos transgredido.

Eu sou o teu poeta
Não saberias me distinguir
Pois já tiveste tantos outros.

segunda-feira, 15 de agosto de 2016

Serpentes sem cabeça

Se aproximou de mim
Para me dizer a verdade
Então ela chorou
E então me silenciei
Por dentro
Depois de notar a presença
De alguns demônios
Que vomitavam
Prosas descabidas
Eu concordei em gozar calado
Visto que é pouco
Quase uma miséria
Pois eu reparei tua face
No rosto dela tinha graxa
A roupa cheia de bolor
Nos bolsos, serpentes sem cabeça.

terça-feira, 9 de agosto de 2016

Prepóstero

Numa mesa abarrotada
De veneno e bebida alcoólica 
Na embriaguez
Do prepóstero 
Usavam um pó da cor
Amarela
Quando foram mijar
Encontraram um útero na privada
Com um feto morto
De uma gravidez psicológica
Enquanto lá fora
Uma madrugada tropical
Cega
E distorcida
Gritava enfurecida
Dialetos modernos.

Campanário

De longe
Vê-se um campanário
Ouve-se histórias assustadoras
De índios mortos e civilizados
Da dor do trabalho
Na labuta da roça em chamas
Da braquiária em chamas
Da terra em chamas.

Aquele campanário da minha infância
Quando eu aprendi a fumar
Toca silenciosamente agora
Aquele campanário
Toca dentro de mim.

segunda-feira, 8 de agosto de 2016

Os adulterados

Os gotas de sangue
Que respingaram nas paredes
Também tinham o teu cheiro
Mas aparentemente
Não havia nenhuma ferida
Não havia
Nenhum cadáver
Não havia
Motivos ou fatos reais
Tudo foi tão nosso
Tudo foi tão em vão
Mas a verdade
Está em nossos óculos escuros
Porque a mentira vomitando
Prazos de validez
Já não pode mais
Nos tocar.

Nos corpos em que te busco sem cessar
Nas feridas internas de órgãos perfurados
Porque o medo mijando
Putas limitações
Já não pode mais
Nos tocar.

Não negues as cores do mar da Bahia
Ele me repete tudo o que nós dois vivemos
Porque a covardia cagando
Maldita nostalgia
Já não pode mais
Nos tocar.



domingo, 7 de agosto de 2016

Ensaio poético: PREPÓSTERO














ensaio poético:


PREPÓSTERO



POR SABIÁ COITELINHO


PRÓLOGO

Depois da turbulência
A calmaria
Como uma forte ressaca
Nossos corpos nus
Uma tal sensação
Que não passa
Você olha para si
Percebendo a estranheza
Essa tal sensação
Que não passa
A liberdade dos pássaros
É fazer o mesmo percurso sempre
Como tal sensação
Que não passa.

O LADO MAIS LINDO DA VIDA

As poesias mais sujas
Que falam de você
Como canções de Caetano Veloso
Ou o suicídio de Jack Kerouac
Ou você acha que um
Alcoólatra não é um suicida?

As poesias mais sujas
Que falam de você
Certas esquinas da cidade
Nessa suja e erótica Bahia
Com seus anjos e demônios
Com o seu sexo exposto.

As poesias mais sujas
Que falam de você
Mastigadas pela censura
Que nós mesmos reproduzimos
Porque elas conseguem entorpecer
O lado mais lindo da vida.

AMOR

Nesses copos sujos
De batom sangue desbotado
Com bebida quente falsificada
Nesses corpos mensuráveis
No amor fútil e escavado
Em encontros que são desencontros
Nessas drogas que não podem
Me aproximar ou me distanciar
Disso que é inaceitável e frívolo
Nessas esquinas vazias
Onde eu me entristecia sozinho
Porque eu apenas me afastava
Nesses textos estuprados
Que não podem me libertar
Nem estancar, nem lhe convencer.

COCAÍNA

Tudo o que fiz
Foi porque eu te amava
Eu sou a cocaína
Teu nariz escorrendo
Teu coração acelerado
Tuas pupilas.

MINAS

Tudo o que vimos
Não é fácil descrever
Porque ainda estamos atordoados
Com as vistas embaralhadas
E sem explicações
Já sabemos que o infinito
Que vimos
É menor que este que está
Além de nós
Tudo é maior
Que as nossas ralas concepções
Quando você ler essas palavras
Isso ficará mais claro.

Quando você ler essas palavras
Espero que você escreva outras
Pois estas não podem ser as únicas.

Quando você ler essas palavras
Saiba que anteontem eu sonhei contigo
E acordei tão feliz.