domingo, 30 de julho de 2017

Ficção

Quando o teu padrasto
Tentou te estuprar
Lembro que a tua mãe ficou do lado dele
Mas eu sei
Que anos depois
Ela te pediu perdão
Porque essa história nunca saiu
Da mente dela
Atormentando-a
Como mil demônios ardendo
Como uma dor
De dente
Insuportável
Especialmente porque ela não entendia
A tua distância
A tua fria
Distância
Mas ninguém tem pena
Das lágrimas de uma mãe
Porque todas choram
Algumas dão a vida
Outras abortam.

terça-feira, 25 de julho de 2017

Depois

Depois de raspar a vulva
Não havia mais obscenidade
Em ti
Do que nas nuvens negras
Que vomitavam
Acidez
Sobre a cidade industrial.

Depois de pintar as unhas
Deixe que o joio e o trigo
Cresçam juntos
Até que chegue
O momento certo da colheita
Para que o trigo não se perca antes.

Depois de derramar o sangue
Eu não podia imaginar
Que as tuas feridas
Estivessem em mim
Até onde eu sei
Só as mulheres te seguiram até o calvário
Muitas delas eram putas
Mal faladas
Uma delas inclusive era a sua própria mãe.

Depois de furar os olhos
Você cantava
Muito lindo
Dentro da gaiola.

Las personas [sabiá en español]

Las personas están aqui
En la habitación
Adentro y fuera
De sus própios cuerpos
Ellas se chupan y se disfrutan
Hablan muchísimo
Tal vez sea porque usan cocaína
Tal vez sean los días de indeterminación
En estos días
Adonde las madres están sordas
Adonde se hace frio en el infierno
En el fondo
Esa gente solamente
Sueña en arrebatar.

Las personas están aqui
Borrachas
Con sus bocas de pintalábios
Color mentira
Lo mejor vino
Se queda para el final
En hojitas de Smoking
Yo te fumaba
Tú me fumabas
Porros que no pueden dar onda
Cigarros
Que traemos con nosotros.

Las personas están aqui
Aburridas
Pero los traficantes y la Iglesia
No quieren ser molestados
Y casi siempre los dicen
Hay gente
Que no se puede
Dar alas.

Las personas están aqui
Ridículas.

sábado, 22 de julho de 2017

De ipês

Quando as prostitutas dormem
É a hora que a cidade
Está mais barulhenta
Porque a alma nunca está quieta
Até mesmo
Quando o corpo adormece
As tardes mais lindas
São aquelas do sol de inverno
Onde nas montanhas secas e desmatadas
Se chove nos olhos
Você não tem ideia
De como te tocar é doloroso
As flores amarelas
De ipês.

É claro que são as manhãs
As responsáveis
Temos acordado
Com a rola na mão
Com a cabeça em uma só coisa
As flores amarelas
De ipês.

Você me disse muito tranquilamente
"Eu nunca te amarei como ela"
Eu ri
Sendo muito sincero
Te respondi
Com a maior calma do mundo
Nela não estava
As flores amarelas
De ipês.

Eu percebi
A distância que os seus olhos
Observavam atentamente
E se perdiam
Mas no fundo
Você apenas procurava por elas
As flores amarelas
De ipês.

terça-feira, 11 de julho de 2017

O tempo da mentira

Nada em ti é como eles
Há dias que despertas
Com muita ressaca
Muita fome
Fome de gente
Fome de carne
De felicidade
Fome de vida
Há dias que a gente
Ejacula vida
E não morte
Porque o tempo da mentira
Já passou.

Como dois canibais sem dentes
Tire minhas roupas e me foda
Depois rasgue a buceta
À pele viva
Você deveria usar uma faca
Para se cortar
Inteira
Porque o tempo da mentira
Já passou.

Depois de cheirar cocaína
Aquelas pessoas conversam muito
Mas eu reparei
Que você transava
Com um
Charuto
Escrevi muitas poesias
Pois você me contou amargamente
Que havia perdido
Seu útero e os seus seios
Em algum lugar
Mas aí você se recordou
Daquela clínica de aborto clandestino
Porque o tempo da mentira
Já passou.

Eu te comia de quatro
Em cima de um lençol
Sujo
Mas sabia que você estava fingindo
Porque o tempo da mentira
Já passou.

quarta-feira, 5 de julho de 2017

O deus da guerra

Os poetas que morrem
Nos campos de batalha
Pelo mundo afora:
O deus da guerra
Faminto
Sem dentes
Cego de um olho
Se masturbando
Desleixado
Com as unhas grandes.
Os poetas que morrem
Ensaguentados
Em alguma cova sem nome
Outros morrem de fome
Alguns pelo abandono
Outros pelo esquecimento.
Os poetas que morrem
Do nosso lado
Em trincheiras
Em esquinas.

Baseado

Me leve pra um lugar tranquilo
Onde eu possa descansar
Pois meu fardo é insuportável:
Já que você se impregnou
Como um baseado
Entre os meus dedos
Amarelados
Com as mãos
Nas contas do meu abdômen
Já que você se misturou
Nos meus pelos do peito
Nos pelos do umbigo
Agora que você se enrolou
Nos meus dreads
Em toda
Penugem
À carne viva
Porque você tem se iluminado
E apagado
Alguns pretéritos
Desde então
Nada passou
Posso te ver sem lupas sujas
Visto que você transtornou
Todas as manhãs.
Me leve pra um lugar tranquilo
Onde eu possa descansar.

sábado, 1 de julho de 2017

A sociedade contemporânea (II)

Deixe que as estéreis
Lhe ensinem
A ser uma mãe de verdade
Da mesma forma
Que as flores
Já nascem mortas
Neste lugar
Tal como construções novas
Que já se assemelham
Com ruínas
Porque o abandono é a pior maldade
Que alguém pode
Cometer
As placas pela estrada
Tem nos orientado
Erroneamente
Como tais remédios
Que não fazem
Mais efeito.

Deixe que as putas
Lhe expliquem
Já que elas conseguem
Segurar o gozo
Quando sentem aquele
Cheiro maldito
De rola
Dentro de si mesmas
Deixe que os quartos
De pousadas sujas
No centro abandonado
Da cidade
Lhe orientem
Deixe que os estupradores
Lhe confessem
O que eles sentem
Depois que cometem
Seus crimes
Ouça as enfermeiras
Assassinas
Dormindo tranquilamente
Talvez
Haja pais amorosos
Que comem as próprias filhas
Depois fumam
Um baseado
Toda travesti chora
As flores sempre nascem
Mortas.